Preconceito contra quem sofre de algum transtorno psiquiátrico gera um estigma nesse pacientes e pode afastar pessoas em sofrimento de procurar ajuda especializada; embora maioria não saiba, psicofobia já é considerada crime
Aproximadamente 1 bilhão de pessoas vivem com algum transtorno mental, de acordo com informações da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). É um número alto, mas que pode ser ainda maior se consideradas as subnotificações de pacientes devido ao preconceito da sociedade– e das famílias – em assumir o transtorno e procurar ajuda especializada.
Esse preconceito contra quem sofre de algum transtorno psiquiátrico já tem nome: psicofobia, que é inclusive considerada crime.
Em 2018, o PLS 74/2014, que tipificava a discriminação como crime chegou a ser aprovada pela Comissão de Direitos Humanos do Senado mas foi arquivado. No entanto, há outros artigos do Código Penal que tratam a psicofobia como crime.
De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria, entre as dez maiores causas de afastamento do trabalho em todo o mundo, cinco são transtornos mentais, como depressão e ansiedade. No entanto, o preconceito e a falta de informação dificultam o diagnóstico, pois as pessoas evitam procurar tratamento por temerem o estigma em torno da doença mental.
“Infelizmente, até hoje o adoecimento mental ainda é encarado por muitos como ‘loucura’, o que é totalmente equivocado”, avalia o médico psiquiatra e diretor da SIG Residência Terapêutica, Ariel Lipman. Ele acrescenta que não é incomum que o preconceito aconteça dentro da própria família do paciente, ou entre aqueles que convivem com a pessoa afetada de forma mais próxima.
“O preconceito é antes de tudo social, e acontece inclusive entre familiares, amigos próximos, vizinhos, colegas de trabalho. Isso é muito ruim e precisa ser combatido por meio da conscientização da população sobre a importância de não ‘sofrer calado’ e de procurar ajuda ao notar sinais de transtorno mental em si mesmo ou em alguém próximo. Esse é o primeiro passo em prol da saúde mental”, diz Lipman.
O psiquiatra explica que o preconceito pode acontecer de várias formas, desde uma situação mais explícita- como, por exemplo, a dificuldade que pessoas com transtornos psiquiátricos têm para conseguir um emprego, sendo eliminadas do processo seletivo pelo RH da empresa ao informarem sobre o transtorno mental, mesmo que controlado, até atitudes mais sutis. “Pessoas próximas podem acabar se afastando da pessoa, o que é uma forma velada de preconceito. Esse tipo de situação por agravar o quadro, pois o paciente percebe a rejeição por parte de pessoas que estima, como também as negativas por parte do mercado de trabalho”.
Combate ao preconceito
Em 2014, o Senado aprovou também a criação do “Dia Nacional de Enfrentamento à Psicofobia”, que estabelece o dia 12 de abril como a data oficial para combater o preconceito contra quem possui alguma doença ou transtorno mental. Para Lipman, esse tipo de iniciativa é bem-vinda, mas cabe à sociedade como um todo agir para que esse tipo de preconceito diminua gradativamente, até, quem sabe, ser extinto.
“O tema está cada vez mais em discussão na mídia e no Estado, e não é à toa que as empresas têm se preocupado com a saúde mental da população e colaboradores. Hoje há companhias que dão incentivos para que os funcionários cuidem da saúde mental – tais como custear parte do valor de sessões de psicoterapia para os colaboradores, ou conceder “day off” para cuidados com a saúde mental, isso tudo pensando de maneira preventiva. São iniciativas positivas, mas é preciso fazer mais, principalmente em relação à conscientização”, avalia ele.
Para Lipman, o cenário de hoje é significativamente melhor do que já foi há algumas décadas, por exemplo. “Estamos no caminho, mas o percurso ainda é longo. Cabe a nós, profissionais da área de saúde mental, e a todos os setores da sociedade, como um todo, continuar trabalhando em prol do combate à psicofobia”, finaliza ele.