Acayaba + Rosenberg reformou espaço de 600 metros quadrados da Gomide&Co, no Edifício Rosa
A galeria Gomide&Co passa a integrar o corredor cultural da Avenida Paulista, com um espaço de 600 metros quadrados no térreo do Edifício Rosa, dos anos 1970, inteiramente reformado pelos premiados arquitetos da Acayaba + Rosenberg.
Localizada na esquina da Avenida Paulista com a Avenida Angélica e próxima à Rua da Consolação, a galeria agrega um importante ponto de efervescência cultural da capital paulista. Foi realizado um projeto de retrofit na fachada envidraçada, que tem um material que inibe a incidência de raios solares e protege as obras de arte e, ainda, permite que a área interna integre-se visualmente à externa.
Ao mesmo tempo em que inaugura o espaço expositivo, a expansão da Gomide&Co se faz também com a chegada de Fabio Frayha, ex-diretor do MASP, administrador especializado no universo das artes visuais, que passa a atuar como sócio da galeria ao lado do sócio fundador Thiago Gomide. Crítica de arte, curadora e pesquisadora com mais de 15 anos de trajetória na arte contemporânea, Luisa Duarte se une ao time como diretora artística.
Em cartaz: “Não vejo a hora”, de Lenora de Barros
“Não vejo a hora” reúne doze trabalhos, em sua maioria inéditos, que têm como denominador comum uma elaboração sobre o tempo. Desde fotografias, vídeo, instalação sonora até uma mesa de ping-pong transfigurada, a artista joga e nos convida a jogar também com as relações entre linguagem, temporalidade e corpo.
Ultrapassando os limites expositivos da galeria, quem chega à exposição já é recebido no lado de fora pela obra “Não vejo a hora” (2023), que enuncia e anuncia o título da mostra através de um letreiro em movimento. Ao se apropriar de uma expressão usada no discurso coloquial brasileiro como uma espécie de ready-made, Lenora provoca a noção de tempo e como nos relacionamos com ele. A linguagem em sua dimensão visual também é explorada em outros trabalhos, como em “ORA ERA” (2008), no qual a artista faz o uso de palavras e cores, jogando com seus significados e usos.
Ao abordar questões temporais e linguísticas, Lenora se desfaz da utilidade de aparelhos para medir o tempo. Entre as obras expostas, quatro têm ponteiros de relógios em sua composição. Na vídeo-performance “Que horas são?” (2023), projetada no teto da galeria, uma chuva de ponteiros precipita sobre uma peneira enquanto escutamos, ao fundo, as respostas de Hélio Oiticica em diálogo com Haroldo de Campos. Em “Nebulosas” (2009/2023) , trabalho que traz uma série de três fotografias, nuvens de ponteiros se tornam espécie de poeiras cósmicas gravitando no breu. Já em “Previsão” (2023), vemos um par de fotografias, no qual linhas das palmas de duas mãos formam uma cartografia sobre a qual pousam os ponteiros. O título remete tanto à ideia de previsibilidade própria aos relógios, quanto à crença de que o nosso destino estaria previsto na parte interior das mãos. Visitando o plano tridimensional, em “Camadinhas” (2023), finíssimas lâminas de vidro sobrepostas guardam ponteiros ao lado de minúsculos pedaços de papel que trazem escritas palavras no diminutivo.
Nesse cuidado minucioso com a dimensão temporal, o corpo, elemento central de toda a produção da artista, também se faz presente. No políptico fotográfico “O Ventre.” (2023), Lenora sobrepõe essas duas dimensões, temporal e corporal, ao manipular argila sobre o fragmento de corpo onde é gestado o começo da nossa contagem de tempo na Terra – o ventre. Dando continuidade a uma longa série a qual a artista desenvolve desde 1990 em torno do ping-pong como receptáculo poético, “Mesa para Ping-Poems (da série Não vejo a hora)” (2023) e quatro kits para jogos de ping-pong “imaginários” nos chamam para nos relacionarmos com nós mesmos e com o tempo de forma não convencional. Entre as demais obras expostas, a instalação sonora “Quanto tempo o tempo tem” (2023) traz a relação entre Lenora e sua mãe, Electra Delduque de Barros, a partir de uma gravação feita entre as duas.
Assim, os trabalhos reunidos em “Não vejo a hora” visitam um território candente da atualidade, aquele da nossa tortuosa relação com o tempo. Lenora de Barros sabe que diante das formas convencionais de medir o tempo, o tempo sempre tira mais de nós do que nós dele. Para pregar uma peça no tempo, a artista trata de subverter tais convenções e para isso coloca em cena o seu repertório poético que faz uso das estratégias do verbivocovisual com vias a nos endereçar, aliando rigor e humor, outras formas de nos relacionarmos com o tempo, tempo que constitui o tecido das nossas vidas.